Entre 2001 e 2011, a cada uma hora e meia uma mulher morreu de
forma violenta no Brasil. Foram 5.664 mortes por ano, 472 por mês, 15 por dia.
E cerca de 40% de todos os assassinatos de mulheres foram cometidos por um
parceiro íntimo.
Os dados, para lá de lamentáveis, foram apresentados hoje pelo
IPEA (Instituto de Políticas Econômicas Aplicadas) e são resultado de uma
pesquisa sobre o feminicídio no Brasil.
Por feminicídio, vale dizer, entende-se o assassinato de
mulheres em decorrência de elas serem simplesmente… mulheres! Ou seja, trata-se
de uma violência extrema que acontece dentro de um contexto de relações sociais
de gênero em que o homem, geralmente atual ou ex-companheiro, entende que tem
legitimidade para tirar a vida de alguém porque esta pessoa seria sua
“propriedade” ou “inferior” a ele.
No período analisado, estima-se que ocorreram mais de 50 mil
feminicídios.
Outra conclusão bastante assustadora é que a Lei Maria da Penha, de prevenção e enfrentamento à violência doméstica e familiar, não contribuiu para reduzir o número de assassinatos de mulheres.
Segundo o relatório, as taxas de mortalidade por 100 mil
mulheres foram 5,28 no período 2001-2006 (antes) e 5,22 em 2007-2011 (depois).
Houve apenas um pequeno decréscimo da taxa em 2007, imediatamente após a
vigência da Lei, quando, acredito eu, a campanha para divulgá-la foi mais
intensa.
Na conclusão do relatório, as pesquisadoras Leila Posenato
Garcia, Lúcia Rolim Santana de Freitas, Gabriela Drummond Marques da Silva e
Doroteia Aparecida Höfelmann destacam “a necessidade de reforço às ações
previstas na Lei Maria da Penha, bem como a adoção de outras medidas voltadas
ao enfrentamento à violência contra a mulher, à efetiva proteção das vítimas e
à redução das desigualdades de gênero no Brasil.”
Elas afirmam ainda que os dados do estudo vão de encontro ao resultados da CPMI da violência contra a
mulher e que
corroboram com o proposta de alterar o Código Penal, inserindo o feminicídio
como circunstância qualificadora do crime de homicídio, “como uma forma extrema
de violência de gênero contras as mulheres”.
Veja alguns outros resultados do IPEA:
§
Os estados
com maiores taxas foram: Espírito Santo (11,24), Bahia (9,08), Alagoas (8,84),
Roraima (8,51) e Pernambuco (7,81). Por sua vez, taxas mais baixas foram
observadas no Piauí (2,71), Santa Catarina (3,28) e São Paulo (3,74).
§
Mulheres
jovens foram as principais vítimas: 31% estavam na faixa etária de 20 a 29 anos
e 23% de 30 a 39 anos. Mais da metade dos óbitos (54%) foram de mulheres de 20
a 39 anos.
§
No Brasil,
61% dos óbitos foram de mulheres negras (61%), que foram as principais vítimas
em todas as regiões, à exceção da Sul. Merece destaque a elevada proporção de
óbitos de mulheres negras nas regiões Nordeste (87%), Norte (83%) e
Centro-Oeste (68%).
§
A maior parte
das vítimas tinham baixa escolaridade, 48% daquelas com 15 ou mais anos de
idade tinham até 8 anos de estudo.
§
No Brasil,
50% dos feminicídios envolveram o uso de armas de fogo e 34%, de instrumento
perfurante, cortante ou contundente. Enforcamento ou sufocação foi registrado
em 6% dos óbitos. Maus tratos – incluindo agressão por meio de força corporal,
força física, violência sexual, negligência, abandono e outras síndromes de
maus tratos (abuso sexual, crueldade mental e tortura) – foram registrados em
3% dos óbitos.
§
29% dos
feminicídios ocorreram no domicílio, 31% em via pública e 25% em hospital ou
outro estabelecimento de saúde.
§
36% ocorreram
aos finais de semana. Os domingos concentraram 19% das mortes.
Ou, em simples português: a violência contra as mulheres é um
problema crônico, cotidiano, que precisa ser enfrentado imediatamente.
Tente lembrar-se, a cada uma hora e meia que passar, daquela
mulher que acaba de ser assassinada, possivelmente por seu parceiro. E se
pergunte, como eu: até quando?
Maíra Kubík Mano - do blog Território de Maíra
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Dados
sobre a autora: Maíra é jornalista. Foi editora da versão brasileira do jornal
Le Monde Diplomatique e da revista Sem Terra. Foi editora-assistente da revista
História Viva e já escreveu para diversos veículos como Rolling Stone, Época,
Caros Amigos, Carta Maior, Carta Capital, TPM, Brasil de Fato, Desafios do
Desenvolvimento (IPEA), revista da ADUSP, OperaMundi e Nova Escola. Atualmente
faz Doutorado em Ciências Sociais na Unicamp, na linha de pesquisa de Estudos
de Gênero, e na Université Paris 7 - Diderot. Foi professora do Bacharelado em
Gênero e Diversidade da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e tem pós
graduação em Gênero e Comunicação pelo Instituto de Periodismo José Martí, em
Cuba, e em Leadership for Media and Democracy pela United Nations University -
International Leadership Institute, na Jordânia. Não passa um dia sem chá mate.
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